Sobre ter para onde voltar
"Ter para onde voltar é mais importante do que ter para onde ir.”
Essa reflexão me encandeceu um sentimento de compreensão sobre o que realmente é importante pra mim atualmente. Tudo bem não saber pra onde ir, no fim, vou sempre arranjar meios de seguir em frente, mas no fim das contas, se eu nao tiver pra onde voltar, por onde fico? Na rua? Do lado de fora da casa de alguém que um dia já me amou? Ou será que me abrigo debaixo de um viaduto qualquer?
Seria mais prático ter meu próprio lar, né? É. Isso é óbvio. Mas durante muitos anos, durante muito tempo, eu não tive essa noção... Para mim, meu lar era onde quem eu amo está. Mas e quando quem eu amo decide que não me ama mais? Que vai embora, e nem vai levar a mala… E aí? Eu fico do lado de fora? Procuro abrigo de novo?
A gente enquanto ser-humano, um ser social, tem essa dificuldade de conciliar o Nós com o Eu, de fazer os dois andarem juntinhos. Aí acaba que o Nós, o Ele, o Aquilo, quando se mostra encantador, leva a gente pra longe do nosso Eu. E quando o encanto acaba, quando algo dá errado, quando somos expulsos do conceito que antes acoplava o Eu ao Outro, a gente se perde.
Acho que no fim das contas, não temos como fugir do Nós, visto que é uma necessidade humana procurar o calor e afeto de alguém em certo nível. Mas a gente precisa saber a hora de voltar para nós mesmos, para o individual e o sentido que ele dá pra nossa vida.
Eu só percebi isso tudo quando me vi cara-a-cara com somente a minha imagem no espelho, após compartilhar uma vida conjunta com alguém durante 1 ano inteiro. “Pra onde eu vou agora? Pra onde vai o conceito que construí sobre mim durante esse tempo todo? Pra onde vai minha ambição, motivação?”, foram perguntas que me rondaram por muito, muito tempo após este acontecimento.
Foi aí que eu quis fazer algo sobre isso. Eu não queria mais construir o meu chão sob o conceito do Nós, eu queria algo maior, um propósito inabalável.
E lá estava eu, pirada! Onde que eu encontro esse diacho de propósito?! Onde que compra isso? Vende na feirinha aqui perto de casa, ou só tem na shopee? É caro pra importar esse “trem”?! Uuuuff..! O mais engraçado é que eu pensava nisso tudo enquanto fazia mil maravilhas, oitenta malabarismos e 70 performances de ballet… Eu nem tinha percebido que, nessa sede toda ao pote, eu já estava criando um chão pra mim mesma. Ajudar minhas amigas, cuidar de bebês, levar meu pai idoso nos médicos dele, fazer minhas lições da faculdade, desenhar, fazer aula de música, me olhar no espelho…
Eu tava ali o tempo todo, eu nem vi que o lugar que eu podia voltar era eu mesma. Que não importava quantas vezes eu errasse, chorasse, e fizesse as piores coisas do mundo, a porta estaria aberta.
No fim, tudo é simples, gente que complica.
Eu vou pra onde eu quiser, quando eu quiser, e se um dia eu não for mais bem-vinda no lugar pra onde eu fui, eu ainda tenho a mim pra voltar, apesar de tudo.